sexta-feira, 26 de agosto de 2011

Lendas e realidades (3)

Ontem recordava aqui a lenda segundo a qual, pela autorizada pena do dr. Mário Soares, a "desregulamentação" de que o mundo froi vítima terá sido o detonador da implosão de 2008 e subsequentes desgraças que nos atingiram e se instalaram entre nós. George W. Bush, em particular, terá, assim reza  a lenda, desempenhado o papel de grande desregulador.

Obama, a 9 de Fevereiro de 2009, na sua primeira conferência de imprensa, após o discurso de tomada de posse, afirmava:
What I won't do is return to the failed theories of the last eight years that got us into this fix in the first place, because those theories have been tested, and they have failed.
Não tendo Obama, na altura, elaborado sobre de que teorias falhadas se tratavam, Thomas E. Woods, em Rollback, adianta algumas especulações:
George W. Bush had been the biggest-spending U.S. presidente since Lyndon Johnson, not exactly a sign of laissez-faire. Did Obama's repudiation of his predecessor mean he would cut spending? Did he mean deficits and the debt would be reduced? Did he mean he wanted the Federal Reserve to stop tinkering with interest rates?

No president ever means that. Obama took those policies and doubled down on them. Change we can believe in turned out to mean more of the same, except worse.
Resta a matéria da "desregulamentação" embora esta hipótese sofra de um problema sério. Com efeito, a única peça legislativa de desregulamentação do sector financeiro (que chegou a ser apontada como factor importante do desastre - revogação parcial do Glass-Steagall Act, de 1933 -) ocorreu durante o mandato de Clinton e, curiosamente, até foi apoiada pelo actual vice-presidente Joe Biden!

Mas talvez que o melhor seja, pelo seu carácter esmagadoramente objectivo, consultar a evolução do número de páginas de regulamentação federal produzidas anualmente que constam do Federal Register (XLS e PDF) que infirmam, à evidência, qualquer tendência desregulamentadora de Bush filho.

- 1993 a 2000 (grosso modo, 2 mandatos de Clinton) - 531,855  páginas (média de 64,482/ano)
- 2001 a 2008 (idem, de George W. Bush) - 587,320 páginas (média de 73,415/ano)
- 2009 a 2010 (1/2 mandato de Obama) - 150,003 páginas (média de 75,002/ano)

Em Portugal, que eu saiba, não existe um registo centralizado que permita fazer esta quantificação embora não sejam precisos grandes dotes estatísticos para intuir a sucessiva e crescente avalanche de "regulamentação", o mesmo é dizer, da diminuição da liberdade de contratar ou, ainda, da prevalência da Lei sobre o Direito.

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